quinta-feira, outubro 30, 2003

Um país no divã de Rui Frade



Lucien Freud

A fanfarra

Um querido amigo, de académicos tempos, há muito que tenta arrancar em pleno com o seu blog, A Fanfarra de Cristo, uma curiosa alegoria pagã e impagável.
De ar sereno e recatado, este indígena de Rio Tinto está ainda baralhado com a natureza da blogosfera "Escreves sobre o quê?, perguntei, há dias, a uma colega de profissão? "Sobre tudo" foi a animadora resposta. Tentei aprofundar a dúvida, soltar-lhe a língua... Disse-me que escrevia sobre as coisas que a enfureciam e que a faziam feliz. Confesso que não fiquei nada curioso para espreitar a literatura...".
Como os amigos são para as ocasiões, aqui vai uma iniciação a uma explicação vulgar, banal e levemente ordinária.
Para mim é uma espécie de psicanálise, é como ter o Freud ou o Rui Frade, (ou será Rui Freud? na versão José Maria Martins é Rui F***-se) bem adiante, ao nosso lado, ouvindo as barbaridades que dia após dia nos consomem ou não.
À partida poderá ter a utilidade que tu lhe dás: de quando fazes ranger as portas da tua fanfarra e soltas um daqueles gritos libertadores. Fechas os olhos sentes baixar em ti o espírito de Leo DiCaprio e gritas "I'm the king of the world!".
Mas nós merecemos muito mais do que isso, merecemos que nos dediques mais atenção e nos fales de outras coisas. Se pensares, unicamente, neste espaço como numa sala onde apenas esticas as cordas vocais estarás a contribuir para o seu autismo e umbiguismo.
Eu sei que trabalhar com a Margarida dá vontade de gritar, mas porque não a conveces a criar um blog. Já estou a ver o nome do blog "O Táxi" ou numa versão mais DeNiro a "Taxi Diver".
Fico à espera de mais acção dessa fanfarra, que por hora está mais metálica do que melodiosa.
Um abraço.

quarta-feira, outubro 29, 2003

A Sophia do Tempo....

Porque é que só a percepção do fim do tempo nos devolve a sua liberdade.
Enclausurado que está Cronos, o tempo passou a ter o valor e a elasticidade do meu livre arbítrio.

"Aqui nesta praia onde
Não há nenhum vestígio de impureza,
Aqui onde há somente
Ondas tombando ininterruptamente,
Puro espaço e lúcida unidade,
Aqui o tempo apaixonadamente
Encontra a própria liberdade."

Sophia de Mello Breyner Andressen

terça-feira, outubro 28, 2003

Sophia de Mello Breyner Andresen

Mais uma vez são as femininas vozes e frases que nos fazem quebrar o silêncio...

"Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão.
Porque os outros têm medo mas tu não.
Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.

Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.

Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não."

sexta-feira, outubro 10, 2003

Maria do Rosário Pedreira

Uma passagem pelo blog do valter hugo mãe levou-me ao encontro de Maria do Rosário Pedreira, como se pode ler, um óptimo motivo para quebrar o silêncio:

- Amanhã, queres ver o mar?

"Quando eu morrer, não digas a ninguém que foi por ti.
Cobre o meu corpo frio com um desses lençóis
que alagámos de beijos quando eram outras horas
nos relógios do mundo e não havia ainda quem soubesse
de nós; e leva-o depois para junto do mar, onde possa
ser apenas mais um poema - como esses que eu escrevia
assim que a madrugada se encostava aos vidros e eu
tinha medo de me deitar só com a tua sombra. Deixa

que nos meus braços pousem então as aves (que, como eu,
trazem entre as penas a saudades de um verão carregado
de paixões). E planta à minha volta uma fiada de rosas
brancas que chamem pelas abelhas, e um cordão de árvores
que perfurem a noite - porque a morte deve ser clara
como o sal na bainha das ondas, e a cegueira sempre
me assustou (e eu já ceguei de amor, mas não contes
a ninguém que foi por ti). Quando eu morrer, deixa-me

a ver o mar do alto de um rochedo e não chores, nem
toques com os teus lábios a minha boca fria. E promete-me
que rasgas os meus versos em pedaços tão pequenos
como pequenos foram sempre os meus ódios; e que depois
os lanças na solidão de um arquipélago e partes sem olhar
para trás nenhuma vez: se alguém os vir de longe brilhando
na poeira, cuidará que são flores que o vento despiu, estrelas
que se escaparam das trevas, pingos de luz, lágrimas de sol,
ou penas de um anjo que perdeu as asas por amor."

Maria do Rosário Pedreira, O Canto do Vento nos Ciprestes

quinta-feira, outubro 02, 2003

Soldadinho de Chumbo II

Não resisto a deixar o link do Público para que todos possam ler o retrato de uma Assembleia Municipal de uma região deprimida, reprimida e comprimida.

Soldadinho de chumbo

Ave rara da política nacional, o soldadinho de chumbo encontrou o seu quartel.
Depois de uma triste investida contra a Cãmara Municipal do Porto, o soldadinho engoliu a derrota, reuniu as tropas e preparou novo ataque.
A seguir à autarquia portuense o soldadinho só mesmo um ataque cirúrgico à Assembelia Municipal de Baião poderia calar o fervor do machado de guerra do personagem.
Desterrado no mais profundo e trauliteiro nterior o soldadinho reúne esporádicamente para bradar, do alto da cadeira de presidente da Assembleia, pérolas como as que agora reproduzo:

- "Acabou o seu tempo! Cale-se senhor deputado! Deixe a sua intervenção na mesa"

- "Acabou o seu tempo senhor deputado. O senhor em vez de ter estado a perder tempo com discursos devia ter lido a sua proposta!". "Não fui eu que inventei a lei, estou aqui para cumpri-la"

- Cale-se senhor deputado! O seu tempo passou!" "O senhor volta-me a fazer isso e chamo para aqui a Guarda Republicana!"

Vai Aze(re)do o clima em Baião

quarta-feira, outubro 01, 2003

Região Prozac

O ex-ministro da Economia, Daniel Bessa, anunciou oficialmente que o Vale do Sousa é uma das regiões mais deprimidas do país.
Onde está a novidade?
Então não foi em Penafiel que António Nobre se radicou tanto tempo.

"Ao mundo vim, em terça-feira
Um sino ouvia-se dobrar! [...]
Vim a subir pela ladeira
E, numa certa terça-feira,
Estive já pra me matar"