quinta-feira, abril 28, 2005

tudo bons rapazes



é o maior acontecimento da semana na região depois do chumbo à Universidade do Vale do Sousa, do chumbo ao acordo entre o Estado e as misericórdias e a vitória do penafiel sobre o Braga.
hoje é gravado o primeiro programa "Tudo bons rapazes", um espaço de análise, ou não, da actualidade regional, nacional e internacional.
Micael Cardoso, Jorge Baptista e moi même, em conversa animada todas as sextas feiras, no RCP (vulgo, Rádio Clube de Penafiel), em 91.8.
este é também um programa de rádio do futuro, temos e-mail e tudo...
a partir de amanhã mandem as vossas sugestões, questões e incertezas para: tbr-rcp@sapo.pt

assaltado pelo conservadorismo

pela enésima vez o meu carro foi assaltado, ainda que nada tivesse para assaltar. mais do que tudo o que me pudessem ter levado, irrita-me esta precisão, quase helvética, de me lembrarem que não estou a salvo e que, mesmo que nada tenha de valor dentro do carro, eles regressarão para me voltar a lembrar.
por isso, e por muito mais, hoje, estou irredutívelmente:

- xenófobo
- a favor da pena de morte
- a favor da prisão perpétua
- a favor da amputação de membros a delinquentes apanhados em flagrante delito
- a favor da liberalização das armas
- contra o rendimento mínimo
- contra os programas de "desculpabilização" dos toxicodependentes

...hoje estou particularmente mal disposto

terça-feira, abril 26, 2005

Penafiel-Benfica, uma proposta

face ao excelente campeonato que tem efectuado, sendo mesmo considerado a melhor aquisição do mercado de Inverno, N'Doye merece uma prenda. FC Penafiel- SL Benfica em Dakar, no estádio "Iba Mar Diop".
depois da hipótese Guimarães, negada por António Oliveira, que depois garantiu que afinal de contas talvez até nem estivesse assim tão descartada. depois desta nova hipoese de realizar o jogo em Paris, entretanto já descartada porque os regulamentos a não prevêem.
eu agora lanço o desafio, a proposta, a petição.
não somos menos que o Estoril. nós vamos mais a Sul.
bora lá para Dakar, jogar à bola, para gáudio de toda a nação senagalesa e como manifestação do nosso empenho na concretização do Rally Lisboa-Dakar.

que bonito...!

noticia, hoje, o jornal "A Bola", que o FC Penafiel vai realizar uns encontros com e sobre os media.
segundo a notícia, o encontro/debate, partiu do departamento juvenil, agora liderado por um ex-jornalista. ainda de acordo com a mesma nota, pretende-se, com este debate, entre outras coisas, facilitar o período de adaptação dos jogadores que saltam da equipa junior, para o plantel profissional. é bonito, efectivamente é muito bonito.
mas será que se vai poder conversar, também, sobre as razões que levam o presidente a não dar entrevistas aos jornais e rádios locais, o que leva certos jornalistas a serem afastados por escreverem textos mais críticos.
era bonito, efectivamente era muito bonito!

sexta-feira, abril 22, 2005

ver com distância

enquanto, por cá, a nossa imprensa se maravilhava com a possibilidade de D. José Policarpo poder ser eleito Papa, na revista brasileira Veja, a análise era bem mais profunda. eles até tinha o cardeal Cláudio Hummes, mas não ficaram por aí. nós tinhamos o cardeal José Policarpo e não fomos mais longe. não há nada como um bocadinho de clarividência e atenção aos pormenores.
estava cá tudo.

"O pontificado de João Paulo II deve muito a Ratzinger, para o bem e para o mal. Agora, o alemão está cobrando o que julga caber-lhe. Ele simplesmente apossou-se da memória de Karol Wojtyla. No pré-conclave, aproveitou-se de uma idéia estapafúrdia para exercer pressão sobre os outros eleitores. Ele permitiu que uma moção de apoio ao início imediato do processo de beatificação de João Paulo II, a ser encaminhado ao próximo papa, fosse submetida aos cardeais que participarão do conclave. O documento foi deixado em cima de uma mesa. Quem quisesse poderia assinar. Muitos se sentiram compelidos a fazê-lo, mesmo sabendo que essa assinatura será cobrada na hora do conclave, para manter a Igreja sob o wojtylismo."

in Veja, Mário Sabino

este texto é também bastante revelador do que espera a igreja católica.

quinta-feira, abril 21, 2005

a lista. que lista? a lista.

a lista do PS em Penafiel, para as autárquicas, não surpreende. mas deveria surpreender? eu entendo que não. a lista é, antes de mais, uma justa compensação para com quem, ao longo dos últimos três anos, deu a cara pelo partido, fazendo oposição à maioria PSD-PP.
dirão, muitos, que se trata de uma lista constituída por segundas figuras. mas se foram as segundas figuras a fazer, exclusivamente, o combate político, então elas tornaram-se nas primeiras figuras.
o resto, as ex-primeiras figuras, não são mais do que uma espécie de Eládios Clímaco, Luís Pereira de Sousa, ou seja, uns tipos porreiros que vão passar a dormir numa prateleira dourada e que serão chamados para encher umas quantas cerimónias e reuniões do partido.
passaram à história.
Agora começa a ser desenhada uma nova fornada socialista em Penafiel. os futuros presidente e vereadores socialistas do PS serão, no futuro, alguns destes que agora se apresentam, mas não todos. muitos destes vão ficar pelo caminho, mas estão a criar bases para um partido mais forte. neste momento serão uma espécie de Marques Mendes, umas formiguinhas a trabalhar para um futuro mais distante.
Há ainda quem diga que "Roma não paga a traidores". é outra explicação. tão válida quanto esta. e tão justa quanto esta.

a família cresceu



acabou de chegar. ainda não deixou ninguém dormir e já roeu muita coisa. ainda assim só temos olhos para ela... a Rita!

terça-feira, abril 19, 2005

pé na tábua ou nos travões?

segundo a Veja, um cardeal muito inspirado caracterizou a igreja desta forma:
"O problema da Igreja é que ela, hoje, é um carro com um motor muito, muito fraco e freios muito, muito bons".

eu não diria melhor.

o grito



Millôr Fernandes, Veja, 2005

segunda-feira, abril 18, 2005

coerência

todos nós já nos habituamos a ouvir da parte de vários vendedores da Fnac que um outro item está esgotado, e minutos depois acabamos por encontrá-lo numa estante. o que nunca tinha visto era uma desorganização tão grande no site da FNAC.
a secção de livros do site é um verdadeiro mundo às avessas. Se procurarem em literatura de língua portuguesa estas são as primeiras sugestões:

- O Livreiro de Cabul, Asne Seisertas
- A Mancha Humana, Philip Roth
- O Mistério dos Sete Relógios, Agatha Christie
- Lust, Elfriede Jelinek
- Cantilenas em Geleia, Boris Vian
- O Atiçador de Wittgenstein, David Edmonds e John Eidinow

até podiam garantir-me que se tratava de literatura (traduzida em ) língua portuguesa. porém há outros erros grosseiros na secção de Literatura de Língua Portuguesa - Lusófona. aí há sugestões deliciosas. a começar pela primeira, "Memória das Minhas Putas Tristes", de Gabriel García Márquez e a terminar em "Um Longo Domingo de Noivado", de Sébastien Japrisot.
estes franceses chegam cá a Portugal e em pouco tempo apanham-nos os tiques todos, até esta capacidade de constante e completa desorganização.

oh Rui, põem lá o disco a tocar!

Quando eu morrer

"Quando eu morrer
Não levarei flores pro meu buraco
Porque eu vou morrer
De cancro
E não se dão flores
A quem morre de cancro
Não há tempo
Ou então vou morrer
Cheio de radiação
Devido a um erro qualquer
Sem importância
Agressão nuclear
Bem planificada e perfeitamente justa
E se eu escapar
Com vida a tudo isto
Morrerei de fome
Comido por um bicho
E não levarei flores
Pr'meu buraco"

Xutos & Pontapés, "78-82"

onde será que meti o meu lenço vermelho e as pulseiras com picos?

"Jerusalém"

"Com dezoito anos Mylia sabia já como humilhar os homens. Conhecia o intervalo existente entre a sedução e a repulsa e sabia manipular esse espaço: reduzindo-o, ampliando-o, fingindo que ele não existe para logo a seguir o exibir de modo ostensivo. Só se humilha quem se aproxima, sabia já por instinto Mylia, e preparava-se assim para exercer essa habilidade perversa - de puxar primeiro para depois empurrar - sobre aquele médico que avançava, logo nos primeiros segundos após a saída dos seus pais, para algo que Mylia receava e desejava: um interrogatório.
- Sou esquizofrénica - disse ela, sem deixar que o médico Theodor Busbeck abrisse a boca. - Li nos livros. Sei bem o que sou. Sou esquizofrénica, louca. Vejo coisas que não existem e sou perigosa. Quer-me curar?"

Gonçalo M. Tavares, "Jerusalém", Círculo de Leitores, 2004

a guerra, os periquitos e uma sala cheia

e a sala foi pequena para ouvir o José Rodrigues dos Santos. falou-se de quase nada de jornalismo e muito sobre investigação e romances históricos.
numa toada muito serena, o autor contou como nasceram as mais de 600 páginas da "Filha do capitão".
falamos da guerra e do destino dos homens.
ouvimos o Filipe perguntar pelos periquitos do "Zé" e ouvimos uma senhora perguntar onde é que o autor tinha feito a primária, porque o marido achava que tinha sido professor dele.
ainda assim falamos bastante e acreditamos ter convertido uns tantos. nós prometemos voltar já neste sábado, às 15, como de costume.

sexta-feira, abril 15, 2005

a star is born

o Rui não pára de surpreender. ele é prémios, ele é notícias, ele é entrevistas. e o pior é que merece isso tudo.

é aqui em casa

a direcção do FC Penafiel veio garntir que jogará com o Benfica no municipal 25 de Abril, chega ao fim uma dúvida que nunca se devia ter colocado.
seria uma tristeza se o Penafiel viesse a fazer a figurinha do estoril que vai jogar ao estádio do Algarve.
A escolha dos "canarinhos" levanta-me três perplexidades e dores de alma:

- o estoril não tem sócios e anda na superliga;
- os poucos que tem não merecem o respeito da direcção que anda com jogos para trás e para a frente sem ligar à massa adepta. acabando por escolher o Algarve como casa emprestada;
- por fim, como é que gastamos tanto dinheiro naquele mastodonte que responde pelo nome de "Estádio do Algarve".

quinta-feira, abril 14, 2005

La Lys

durante anos a mesma coroa, no mesmo sítio. Durante anos um sítio, La Lys.
durante anos La Lys foi um sítio sem sítio, uma palavra. Sábado à noite vamos ler La Lys, ver um sítio, uma trincheira e um corpo, muitos corpos, expedicionários e caídos.
sábado à noite o José Rodrigues dos Santos vai falar da "Filha do capitão", dos seus olhos verdes e dos homens que morreram na Flandres.
Sábado à noite, às 21.30, a biblioteca vai abrir apenas um livro. este

ainda não parei de viajar, esta tarde

Overmundo

"Os pinheiros assobiam, a tempestade chega:
Os cavalos bebem na mão da tempestade.

Amarro o navio no canto do jardim
E bato à porta do castelo na Espanha.
Soam os tambores do vento.

"Overmundo, Overmundo, que é dos teus oráculos,
Do aparelho de precisão para medir os sonhos,
E da rosa que pega fogo no inimigo?"

Ninguém ampara o cavaleiro do mundo delirante,
Que anda, voa, está em toda a parte
E não consegue pousar em ponto algum.
Observai sua armadura de penas
E ouvi seu grito eletrônico.

"Overmundo expirou ao descobrir quem era",
Anunciam de dentro do castelo na Espanha.
"O tempo é o mesmo desde o princípio da criação",
Respondem os homens futuros pela minha voz."

Murilo Mendes, "Poesia Liberdade", 1947

terça-feira, abril 12, 2005

VOCÊ

queria escrever-TE com a ausência de distância da segunda pessoa do singular.
acreditei, até hoje, na cumplicidade das duas letras, TU. pressentia uma certa proximidade nesse tête-a-tête ortográfico.
mas há erros assim, o que separa a maioria, a nós une-nos. é para SI que guardo esta cerimoniosa abordagem. Um VOCÊ feito de quatro letras, tantas quantos os lados desta relação. porque somos quatro. não somos dois pares de TU’s. somos um imenso VOCÊ.
os nossos afectos, hoje mais do que nunca, conjugam-se nesta quadratura. não há geometria com dois lados, ninguém constrói com duas dimensões, com dois planos.
não é à toa que a mais perfeita das figuras é o quadrado, o único momento em que todos somos iguais com o mesmo tamanho, o mesmo peso, a mesma responsabilidade no equilíbrio do desenho.
há muitos anos que homem se debate com a necessidade de encontrar um quadrado com a mesma área de uma circunferência dada. chamaram a isso a quadratura do círculo. nós somos a solução, material, desse desafio. o equilíbrio das certezas equiláteras, com uma enorme dinâmica circular, fluida e feita de constantes retornos.
Somos uma impossibilidade geométrica, feita de equilíbrios instáveis e no entanto tão sólida.
hoje não troco, por nada, os quatro lados deste VOCÊ. Saboreio com prazer o ritual do “gosto muito de SI”, do “sirva-SE”, e do “sinto muito a VOSSA falta. tenho muitas saudades VOSSAS”.
VOCÊS são a minha conta certa.
Para quem há muito escolheu os amigos como uma fé, VOCÊS são a minha “SAGRADA FAMÍLIA”. E convenhamos ninguém trata o vosso “NOSSO SENHOR” por TU.

o rei Artur


Einstürzende Neubauten

hoje lembrei-me do Artur ao ler uma notícia sobre o concerto destes senhores (de quem nunca saberei pronunciar o nome). o Artur é, juntamente com o Jorge, uma das mais importantes conquistas do tempo da Escola Superior de Jornalismo.
há anos que mantemos uma ligação de sangue e de música. de música escura e densa. e de muitas divergências. concordamos com o Peter Murphy, como o Nick Cave and The Bad Seeds (de quem estou a ouvir, agora mesmo, os B-sides & rarities) ou Old Jerusalem, já quanto à outra música portuguesa...
hoje ele vai estar na primeira fila para ouvir os motores a roncar e as baladas chapinhadas na água.

segunda-feira, abril 11, 2005

um dia severino

"(...)
E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida).

Somos muitos Severinos
iguais em tudo e na sina:
a de abrandar estas pedras
suando-se muito em cima,
a de tentar despertar
terra sempre mais extinta,

a de querer arrancar
alguns roçado da cinza.
Mas, para que me conheçam
melhor Vossas Senhorias
e melhor possam seguir
a história de minha vida,
passo a ser o Severino
que em vossa presença emigra.
(...)"

João Cabral de Melo Neto, "Morte e vida Severina"

sexta-feira, abril 08, 2005

começa amanhã

Ciclo literário aproxima Penafiel dos livros

primeiro Penafiel, depois o mundo

quinta-feira, abril 07, 2005

em nome dos €'s

apesar de só se realizar daqui a um mês, o jogo entre o FC Penafiel e o Benfica já começa a agitar a cidade. Não que exista, como tanto se apregoa, uma onda vermelha, pronta a varrer a capital do Vale do Sousa, mas porque, a esta distância, ainda não se sabe onde terá lugar a partida.
por altura do jogo estaremos já na antepenúltima jornada, o mesmo será dizer que, se tudo correr bem, o FC Penafiel terá já a sua posição, na tabela classificativa, consolidada.
aqui é que bate o ponto, porque, segundo sei, a direcção equaciona a possibilidade de o FC Penafiel poder jogar no estádio do Vitória de Guimarães e com isso fazer uma receita de bilheteira histórica.
só se o FC Penafiel precisar do jogo é que deverá estar disposto a jogar em casa e tirar partido de um campo com medidas mais reduzidas.
ou seja, o FC Penafiel depois de ter visto ser investida uma fatia generosa do dinheiro do erário público na remodelação do estádio municipal, admite a troco de mais uns euros, jogar noutro estádio.
mais, num acto de gratidão, a direcção do FC Penafiel admite privar os seus sócios de ver o mais do que provável campeão nacional a jogar na sua terra.
mais, isto depois do FC Penafiel ter estado longe do contacto com os grandes durante uma dúzia de anos.
Resumindo, a direcção do FC Penafiel admite que se passe por cima do investimento público, na dotação de condições condignas para receber a Superliga, e ir pregar para outra freguesia.
que eu saiba os vimaranenses não investiram um tostão no FC Penafiel, já os sócios e a autarquia abriram os cordões à bolsa para que o clube se apresente com um ar lavadinho entre os maiores.
num momento em que tudo se move em função do dinheiro, há ainda exemplos de alguma vergonha na cara, é o caso do Rio Ave que este fim de semana vai arrecadar 250 mil euros, sem sair de casa. refira-se que os vilacondenses têm já a sua posição mais do que consolidada (7º).
e se isso não bastasse os penafidelenses têm mais sócios que os de Vila do Conde.
mas vamos acreditar que tudo isto não passa de um "suponhamos".

quarta-feira, abril 06, 2005

crónica de sua majestade, a palavra

arrancamos no Sábado com o ciclo literário "Entre Pedras, Palavras", vamos conversar com o Bruno Santos, um autor da casa, a quem queremos dedicar o carinho, que só guardamos aos que nos são próximos.
vamos falar de literatura, sem pensar se é infantil, juvenil ou adulta, até porque há muita literatura que parecendo infantil é muito adulta e outra tendo sido escrita para graúdos, não passa de um exercício muito pueril.
Esperamos pelo Bruno Santos e muitos mais, às 15, na biblioteca de Penafiel.



"Este é um reino que eu e o Júlio conhecemos. Qualquer coincidência com a sociedade actual é propositada. (...)“Sua Majestade, o Príncipe” resulta da observação de um reino que, digam o que disserem, existe algures. Basta procurar debaixo das camas, ou dentro do meu computador que tem sido incansável, ou por sob escuta os nossos telefones!..."

Bruno Santos, in re-searcher

Saul Bellow (1915-2005)

"Em breve esgotou as palavras, a sensatez, a coerência. A fonte de todas as lágrimas abrira-se de repente dentro dele, negra, profunda e quente, e elas jorravam e convulsionavam-lhe o corpo, vergando-lhe a cabeça teimosa, encurvando-lhe os ombros, retorcendo-lhe o rosto, enclavinhado-lhe as mesmas mãoos com que segurava o lenço. Os seus esforços para se dominar eram inúteis. O enorme nó de injustiça e dor que tinha na garganta subiu, e abandonou-se inteiramente; segurou na face e chorou. Chorou com todo o coração.
Era ele o único, entre todas as pessoas que enchiam a capela, que soluçava. Ninguém sabia quem era."

Saul Bellow, "Agarra o dia", Fragmentos, 1974

terça-feira, abril 05, 2005

sondagem

a partir deste momento está aberto um novo serviço: a sondagem. mesmo acima da lista de blogs vou ter regularmente uma sondagem muito própria. é claro que com o avançar do tempo passarei a ter uma ou outra de pendor mais político. veremos como corre. para já avançamos pelo mundo dos livros.

sexta-feira, abril 01, 2005

o tigre

"Tigre, tigre, chama pura
Nas florestas, noite escura,
Que olho ou mão imortal cria
Tua terrível simetria?

De que abismo ou céu distante
Vem tal fogo coruscante?
Que asas ousa nesse jogo?
E que mão se atreve ao fogo?

Que ombro & arte te armarão
Fibra a fibra o coração?
E ao bater ele no que és,
Que mão terrível? Que pés?

E que martelo? Que torno?
E o teu cérebro em que forno?
Que bigorna? Que tenaz
Prò terror mortal que traz?

Quando os astros lançam dardos
E seu choro os céus põe pardos,
Vendo a obra ele sorri?
Fez o anho e fez-te a ti?

Tigre, tigre, chama pura
Nas florestas, noite escura,
Que olho ou mão imortal cria
Tua terrível simetria?"

William Blake, tradução de Vasco Graça Moura

Mitzváh

"O que quer dizer para mim o Kipúr? Quer dizer sentir-me judeu. E que quer dizer sentir-me judeu? Quer dizer sentir-me eu próprio. Uma pessoa que vem de longe, que atravessou muitas vidas numa só e que sempre teve como ponto de referência o ser judeu. Ser judeu quer dizer prestar atenção, fazer o melhor possível para garantir alguma certeza a si mesmo e aos outros. Quer dizer saber ser olhado com suspeita, com inveja ou com respeito excessivo, mas de qualquer modo como um perigo. Ser judeu quer dizer ter de defender-se, tentar construir uma força interior para não ser destruído. Ser judeu quer dizer ter a responsabilidade de levar para a frente a cultura de um povo com mais de cinco mil anos de história e que ninguém ainda conseguiu, apesar das muitíssimas tentativas, exterminar, mandar calar. Ser judeu é um exercício de modéstia. É preciso saber a priori que nem tudo é acessível a um judeu, assim como a uma pessoa de cor, a um homossexual ou um cigano."

Alain Elkann, "Mitzváh, Cavalo de Ferro, 2005